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sábado, 23 de janeiro de 2010

ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA

Sábado, 23 de janeiro de 2010

Células-Tronco
Brasil pode acompanhar pesquisas mundiais

Raquel Landim

Vencedor do prêmio Nobel de Medicina, Mario Capecchi avalia que ainda há tempo para o Brasil participar da "aventura" com células-tronco embrionárias, após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada, que autorizou a pesquisa. "O Brasil tem muitos cientistas jovens. Não é possível prever onde as descobertas importantes serão feitas", disse ao Valor.

O cientista acredita no potencial da pesquisa para encontrar a cura de doenças como Parkinson, Alzheimer ou diabetes através da descoberta de novos remédios ou da fabricação de células para transplantes. Mas enfatizou que os resultados não virão no curto prazo, mas em "15 ou talvez 20 anos".

Capecchi dividiu o prêmio Nobel de 2007 com dois pesquisadores por suas descobertas de como produzir camundongos mutantes. Ele desenvolveu uma tecnologia, o "gene targeting", que insere um gene específico nas células-tronco embrionárias dos ratos, dando origem a animais híbridos, com metade do DNA original e metade mutante. Esse método permite estudar as funções de genes específicos, que podem ser "nocauteados".

Filho de pai italiano e mãe americana, Capecchi nasceu em Verona, em 1947, e teve uma infância difícil. O pai morreu na Segunda Guerra Mundial e a mãe foi enviada para um campo de concentração. Ele viveu três anos nas ruas e chegou a passar fome. Aos nove anos, reencontrou a mãe, que sobreviveu aos nazistas. A família emigrou para os Estados Unidos, país onde descobriu sua vocação como cientista.

"Qualquer restrição à pesquisa não é uma boa idéia. Minha filosofia é que a busca de informação não têm efeitos ruins", disse. Capecchi defendeu que as aplicações da ciência devem ser analisadas por toda a comunidade, mas que "nada é definitivo". O cientista chegou a citar a clonagem humana. Ele disse que é "totalmente contra" hoje, mas consegue imaginar uma situação em que seria a única maneira de ter filhos. A seguir os principais trechos da entrevista.

Valor: As pesquisas com células-tronco geram muita expectativa. As pessoas esperam a cura para doenças como Parkinson, Alzheimer, diabetes e até paralisia. É possível alcançar resultados no curto prazo?

Mario Capecchi: As promessas são enormes, no entanto, não são para um futuro imediato. Temos que entender como trabalhar com células-tronco, como criá-las de uma forma que funcionem adequadamente. Minha estimativa é que vai levar 10, 15, talvez 20 anos. Por outro lado, se não fizermos a pesquisa, nunca chegaremos lá. É uma pesquisa extremamente excitante e importante, mas ainda para um futuro distante.

Valor: A pesquisa com células-tronco será mais valiosa para a descoberta de novos medicamentos ou para o transplante?

Capecchi: Nunca coloque todos os ovos em uma cesta. Meu palpite é que as células-tronco serão utilizadas para ambos os propósitos. A promessa é conseguir transplantes diretos, mas também é importante a habilidade de isolar células e utilizá-las para análise de medicamentos. O mais fácil é criar células in vitro e trabalhar para a descoberta de remédios, mas depois é preciso testá-los em humanos e observar se não há efeitos colaterais. É importante perseguir os dois.

Valor: O senhor desenvolveu uma poderosa ferramenta de pesquisa, o "gene targeting". Como essa técnica pode ajudar no tratamento de doenças hoje incuráveis?

Capecchi: Não utilizaremos células-tronco apenas como células-tronco. Queremos modifica-las e uma maneira de fazer isso é mexer em um gene específico. Já podemos modificar genes em células-tronco embrionárias de camundongos da maneira que quisermos e o mesmo está começando com as humanas. É aí que está o poder: modificar. Se você trabalha, por exemplo, com a doença de Parkinson, quer que as células-tronco controlem a má-formação dos neurônios ou produzam agentes capazes de induzi-los a funcionarem normalmente. Serão necessárias muitas mutações e isso é possível com o gene targeting.

Valor: O senhor criou animais híbridos, com metade do DNA original e metade mutante. Enfrentou muita controvérsia?

Capecchi: Nosso pacientes são ratos. Não enfrentamos muita controvérsia porque as pessoas entendem que é importante fazer experimentos com os ratos, aprender e então aplicar em humanos. No início, sim, tivemos uma discussão enorme sobre a tecnologia de recombinar DNA. A quantidade de papelada que tínhamos que fazer no início da pesquisa era imensa e isso nos atrasou muito. Mas, com o tempo, ficou claro que nada ruim aconteceu por conta da recombinação de DNA.

Valor: Como o senhor se sente em destruir embriões? O senhor tem questionamentos éticos?

Capecchi: Certamente tenho dúvidas, mas há outros aspectos. Por conta da fertilização in vitro, embriões foram gerados e estocados em geladeiras. Quando a geladeira fica cheia, são simplesmente jogados fora. Se os embriões são mortos de qualquer forma, por que não utiliza-los para bons propósitos? E há uma outra questão ética. Temos pacientes com Alzheimer, Parkinson, diabetes. Não devemos tentar encontrar o melhor tratamento possível? É correto ter a tecnologia e não aplicar?

Valor: O Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro aprovou uma lei que libera a pesquisa com células tronco embrionárias. É muito tarde ou ainda há tempo para o Brasil se beneficiar dessa pesquisa?

Capecchi: Ainda há muito o que aprender. Ninguém aplicou essa tecnologia ainda. O Brasil tem muitos cientistas jovens. Não é possível prever onde as descobertas importantes serão feitas. Estou muito feliz com a aprovação e espero que o Brasil contribua com essa aventura.

Valor: A pesquisa em células-tronco pode atrair investimento para o Brasil e estimular o desenvolvimento econômico?

Capecchi: A saúde é extremamente importante para o desenvolvimento econômico. Mão-de-obra saudável e produtiva é pré-requisito para o desenvolvimento. Sem isso, não existe economia forte. Pessoas talentosas que sofrem de Parkison ou Alzheimer se tornam, de repente, disfuncionais. Uma coisa interessante da biotecnologia é que não é nem de longe tão caro quanto a física, que requer máquinas enormes e tecnologia de ponta. Nesse sentido, é mais fácil conseguir fundos para as pesquisas.

Valor: O senhor nasceu na Itália, um dos poucos países do mundo que proíbe a pesquisa com células-tronco embrionárias. O que um país perde ao optar por não desenvolver essa tecnologia?

Capecchi: O investimento em saúde em qualquer país é enorme. Através de biotecnologia e pesquisa médica, os tratamentos se tornarão mais baratos e efetivos. O país que não investir ficará para trás e dependerá de outros para desenvolver tratamentos. E há uma questão ética: por que um país deve prover toda a cura e outro somente tirar vantagem sem ajudar? É algo que todos devem estar preocupados.

Valor: A lei que foi aprovada no Brasil autoriza pesquisa em embriões inválidos ou congelados por mais de três anos. O senhor acha que é restritivo?

Capecchi: Qualquer restrição não é uma boa idéia. Minha filosofia é que a busca de informação não tem efeitos ruins. É a aplicação que é boa ou ruim, exige reflexão e envolvimento de todos. Mas um aspecto importante é que nada deve ser definitivo. Um exemplo é a fertilização in vitro. Quando surgiu, as pessoas estavam horrorizadas. Hoje é rotineiro em vários países. Esse é um exemplo de como a sociedade muda. A clonagem humana, por exemplo, seria terrível. Não apoiaria isso agora, mas consigo imaginar uma situação em que grande parcela da população se tornasse estéril e não pudesse ter filhos a não ser por clonagem. É preciso manter a mente aberta.

Valor: O senhor teve uma infância difícil. Isso o influenciou?

Capecchi: É difícil responder, porque não pode ser repetido. Não posso viver duas vidas e comparar (risos). Meu palpite é que a experiência me tornou confiante. Foi uma conseqüência, já que tinha que me proteger, encontrar comida, cuidar de mim ainda muito jovem. Faço ciência da mesma forma. Tento tornar o meu laboratório auto-suficiente.

A entrevista foi orignlamente publicada no jornal Valor Econômico desta seunda-feira (2/6/2008)


http://www.apm.org.br/aberto/noticias_conteudo.aspx?id=6130

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